O
Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003) foi publicado, não por acaso, no dia 1º de
outubro, há exatos dez anos, em homenagem ao Dia Internacional do Idoso. A data
especial foi instituída pela Organização das Nações Unidas (ONU) em alusão à
Assembleia Mundial sobre o Envelhecimento, realizada em 1982, na Áustria. A
mesma data foi escolhida para a criação de um dia nacional dedicado aos
brasileiros sexagenários em diante.
É considerada idosa, para efeitos da lei, a pessoa com pelo menos 60 anos de idade. No Supremo Tribunal Federal (STF), tramitam processos que discutem direitos dos idosos, como a abusividade ou não do reajuste de mensalidades de planos de saúde com base na idade, desaposentação e transporte gratuito interestadual, surgidos a partir da edição do estatuto.
O Estatuto
A
Lei 10.741 obriga a família, a sociedade e o Poder Público a assegurar ao
idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania,
à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária. O
estatuto prioriza também o acesso à Justiça e o recebimento de restituição do
imposto de renda, e criminaliza o abandono, a discriminação e outras formas de
maus tratos contra os idosos.
Com
a legislação específica, passageiros de mais idade conquistaram o direito à
reserva de dois lugares gratuitos no transporte coletivo interestadual e o
pagamento de meia-entrada nos demais assentos. A conquista, entretanto, foi
contestada no STF, bem como o pagamento do benefício de prestação continuada e
a proibição da cobrança diferenciada pelos planos de saúde aos idosos que
assinaram contrato antes da entrada em vigor do estatuto.
O
Estatuto do Idoso traz avanços ao instituir o atendimento especializado nas
áreas de geriatria e gerontologia na rede pública de saúde, o fornecimento
gratuito de medicamentos, especialmente os de uso continuado, e de próteses,
órteses e outros recursos relativos ao tratamento, habilitação ou reabilitação.
Prevê ainda o direito à meia-entrada em eventos artísticos, culturais,
esportivos e de lazer e o acesso preferencial aos respectivos locais. Também
fica proibida qualquer forma de discriminação ao idoso no mercado de trabalho e
no exercício profissional, sendo a idade mais avançada um critério de desempate
nos casos de concurso público. Na área de assistência social, o estatuto
garante o pagamento de um salário mínimo como benefício de assistência
continuada à pessoa com mais de 65 anos que não tenha meios de prover sua
subsistência, nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social (Loas).
Fenômeno mundial
O
Brasil passa por um processo de envelhecimento acelerado de sua população. Nos
últimos 20 anos, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), o número de idosos no país dobrou. Entre 2001 e 2011, houve
um aumento da população idosa de 15, 5 milhões para 23,5 milhões. Dados
divulgados em agosto deste ano apontam que, em 2060, um quarto da população
brasileira será de pessoas com mais de 65 anos, ou seja, cinco anos a mais que
o mínimo fixado em lei para que uma pessoa seja considerada idosa.
Mas
a escalada de envelhecimento não é um fenômeno nacional. A população mundial
está passando pelo mesmo processo, com o aumento da expectativa de vida.
Segundo estimativas do Fundo de Populações das Nações Unidas, uma em cada nove
pessoas no mundo tem 60 anos ou mais, e a expectativa é de que em 2050 a
população de idosos seja de dois bilhões de pessoas.
No
Brasil, a expectativa de vida é de 74,8 anos, sendo 71,3 anos para os homens e
78,5 anos para as mulheres. No Japão, país que se orgulha da longevidade de sua
população e dedica um feriado nacional aos idosos na terceira segunda-feira de
setembro, a expectativa de vida é de 86 anos para as mulheres e 80 anos para os
homens. Mas a longevidade de muitos japoneses vai além, e o país tem mais de 54
mil pessoas com mais de 100 anos de idade, segundo o Ministério da Saúde
daquele país.
Aposentadoria compulsória
Se
na iniciativa privada há aqueles que se aposentam e retornam ao mercado de
trabalho ou optam por continuar trabalhando enquanto tiverem vontade,
disposição ou necessidade, no setor público há muitos que são contra a
imposição da aposentadoria aos 70 anos, fixada pela Constituição Federal no
artigo 40, parágrafo 1º, inciso II. Os ministros Celso de Mello e Marco
Aurélio, ambos com mais de 20 anos de STF, já se posicionaram contrariamente à
compulsória.
O
ministro Marco Aurélio já deu declarações classificando como “castigo” a
imposição legal para a aposentadoria no setor público e manifestou-se sobre o
tema em plenário. “A aposentadoria há de representar uma recompensa, nunca um
castigo, para quem, pelo tanto que se dedicou à causa pública, merece ao menos
ser considerado digno e apto a concluir, por si mesmo, já ter cumprido a
própria jornada”, afirmou o ministro em 2008, na solenidade de homenagem ao
centenário de nascimento dos ministros Olavo Bilac Pinto e Raphael de Barros
Monteiro, ambos aposentados por limite de idade. Para o ministro Marco Aurélio,
“devem-se repensar preceitos constitucionais que arbitrariamente imprimem
limite não biológico à capacidade produtiva de um ser humano, que restringem o
exercício livre do universal direito ao trabalho”.
É
compulsória a aposentadoria de funcionário público da União, estados,
municípios e Distrito Federal dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário
quando estes atingem a idade limite de 70 anos. Mas não foi sempre assim.
Conforme relatou o ministro Celso de Mello, em seu livro intitulado “Notas
sobre o Supremo Tribunal Federal (Império e República)”, a aposentadoria
compulsória por idade só foi introduzida no sistema constitucional brasileiro
pela Constituição Federal de 1934.
Antes,
não havia limite de idade para o exercício da magistratura, que contava com a
sabedoria e a experiência de juízes como o ministro André Cavalcanti, que
presidiu a Suprema Corte até os 93 de idade. Como a Constituição republicana de
1891 não previa a aposentadoria por idade, outros ministros compuseram a
Suprema Corte brasileira para além dos 70 anos, como Herminio Francisco do
Espirito Santo (83 anos), Olegario Herculano D’Aquino e Castro (78 anos), Sayão
Lobato, o Visconde de Sabará (75 anos), Ribeiro de Almeida (75 anos), Edmundo
Lins (74 anos), Freitas Henriques, que foi o primeiro presidente do STF aos 72
anos de idade, Godofredo Cunha e Tristão de Alencar Araripe (71 anos).
Renovação no STF
Nos
últimos anos, o Supremo Tribunal Federal passou por grande renovação, com a
aposentadoria de vários de seus ministros em razão do limite de idade. Somente
em 2003, há dez anos, foram três: os ministros Sydney Sanches, Ilmar Galvão e
Moreira Alves. Tivemos ainda, em 2008, a aposentadoria do ministro Carlos
Velloso e, em 2011, a do ministro Eros Grau.
No
ano passado, também deixaram a Corte, por imposição constitucional, os
ministros Cezar Peluso, que sucedeu Sydney Sanches, e Ayres Britto, sucessor de
Ilmar Galvão.
Na
última década, também houve ministros que optaram por deixar o cargo antes da
idade limite, como Nelson Jobim, Sepúlveda Pertence e Ellen Gracie, sucedidos
respectivamente pelos ministros Cármen Lúcia, Menezes Direito (falecido e
sucedido pelo ministro Dias Toffoli) e Rosa Weber.
Julgados
Veja
abaixo processos que evocam, de alguma maneira, o Estatuto do Idoso como forma
de garantia de direitos constitucionalmente amparados às pessoas com idade a
partir de 60 anos.
Assistência Social - No dia 18 de abril de 2013, o Plenário
julgou inconstitucional o parágrafo 3º do artigo 20 da Lei Orgânica da
Assistência Social (LOAS - Lei 8.742/1993), que prevê como critério para a
concessão de benefício a idosos ou deficientes a renda familiar mensal per
capita inferior a um quarto do salário mínimo. O recurso extraordinário foi
interposto pelo INSS, que questionava o critério utilizado para aferir a renda
mensal per capita da família da autora. O Plenário considerou o critério
defasado para caracterizar a situação de miserabilidade e também declarou
inconstitucional o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso. A decisão
foi tomada no julgamento dos Recursos Extraordinários (REs) 567985 e 580963,
ambos com repercussão geral.
Transporte interestadual - Em fevereiro de 2010, o Plenário
confirmou a gratuidade para o transporte de idosos em ônibus interestaduais. A
decisão foi tomada na Suspensão da Segurança (SS 3052) ajuizada pela Agência
Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e cassou os efeitos de um mandado de
segurança que havia barrado a gratuidade. Com a decisão, as empresas de ônibus
interestaduais passaram a ter de reservar duas vagas gratuitas por ônibus para
idosos com renda igual ou inferior a dois salários mínimos e oferecer desconto
de 50% no preço das passagens para os demais idosos que excederem as vagas
gratuitas, até o julgamento final do caso na Justiça Federal.
Juizados Especiais/crimes
contra idosos - Em 2010,
o Plenário concluiu o julgamento em que se discutia se os autores de crimes
contra idosos teriam ou não direito a benefícios como conciliação ou transação
penal. A questão foi tratada na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3096)
ajuizada pelo procurador-geral da República contra o artigo 94 do Estatuto do Idoso,
que determina a aplicação dos procedimentos e benefícios relativos aos Juizados
Especiais aos crimes cometidos contra idosos cuja pena máxima não ultrapasse
quatro anos. O entendimento foi o de que o dispositivo legal deve ser
interpretado em favor do seu específico destinatário – o próprio idoso –, e não
de quem lhe viole os direitos. Com isso, somente se aplicam as normas
estritamente processuais para que o processo termine mais rapidamente, em
benefício do idoso.
Transporte urbano - Em 2006, o Plenário manteve a
gratuidade do transporte coletivo urbano prevista no Estatuto do Idoso e na
Constituição. Por maioria, o Tribunal julgou improcedente a Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADI) 3768, que questionava o artigo 39, caput, do
estatuto. Prevaleceu o voto da relatora, ministra Cármen Lúcia, que considerou
autoaplicável o artigo 230 da Constituição, que assegura o amparo ao idoso e o
acesso ao transporte urbano gratuito.
Repercussão Geral – Recursos Extraordinários com
repercussão geral reconhecida aguardam julgamento no Plenário do STF por
apresentarem relevância do ponto de vista econômico, político, social e
jurídico, nos termos do parágrafo 1º do artigo 543-A do Código de processo
Civil (CPC). São eles:
Desaposentação - O sistema previdenciário brasileiro
exige idade mínima e tempo de contribuição para que se efetive o recebimento do
benefício integral. Mesmo depois de aposentados, muitos segurados do INSS optam
por retornar ao mercado de trabalho, voltando também a contribuir para o
sistema previdenciário. Com isso, buscam na Justiça o direito de poder trocar o
benefício por uma aposentadoria mais vantajosa, baseada na média das últimas
contribuições. É a chamada desaposentação, que está em discussão nos Recursos
Extraordinários (RE) 381367 e 661256.
O
Plenário Virtual do STF reconheceu a existência de repercussão geral na questão
constitucional discutida no RE 661256. Já o RE 381367 teve seu julgamento
iniciado pelo Plenário em setembro de 2010. Após o voto do ministro Marco
Aurélio (relator), no sentido de prover o recurso de uma aposentada, o
julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro Dias Toffoli. O
processo já foi liberado e aguarda retorno à pauta.
Planos de saúde - O RE 630852 está com a ministra Rosa
Weber e discute a aplicação do Estatuto do Idoso aos planos de saúde anteriores
a ele. O processo foi interposto pela Cooperativa de Serviços de Saúde dos
Vales do Taquari e Rio Pardo Ltda. (Unimed), e distribuído originalmente à
ministra Ellen Gracie. A cooperativa médica sustenta que a aplicação do
estatuto em contrato de plano de saúde firmado antes de sua entrada em vigor
viola o ato jurídico perfeito (artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição).
No
recurso, a cooperativa questiona acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande
do Sul (TJ-RS) que considerou abusivo o reajuste da mensalidade do plano de
saúde quando a consumidora completou 60 anos de idade. Com a aposentadoria da
ministra Ellen Gracie, o recurso foi distribuído à ministra Rosa Weber, que, em
abril deste ano, deferiu o pedido da Amil Assistência Médica Internacional S/A,
da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e da Federação Nacional de Saúde
Suplementar (Fenasaúde) para ingressarem na ação na condição de amici curiae.
Idosos em creches no DF - Já está liberada para julgamento no
Plenário a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3534) ajuizada pelo
Governo do Distrito Federal contra a Lei distrital 3.593/2005, que autoriza o atendimento
de idosos em creches. O governo do DF argumenta que as creches são destinadas
por lei ao atendimento de crianças entre zero e seis anos de idade, e que é
incompatível atender devidamente às crianças e aos idosos, como prevê o
Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90) e o Estatuto do Idoso (Lei
10.741/2003).
Outras
informações sobre avanços e o que ainda falta ser feito em benefício dessa
população cada vez maior e contributiva ao país está no quadro “Saiba Mais”, do
canal do STF no YouTube, sobre o aniversário de 10 anos do Estatuto do Idoso.
Fonte: STF
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