domingo, 17 de junho de 2012

Integra do PL Nº 2.300, DE 1996



COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO E JUSTIÇA E DE REDAÇÃO
PROJETO DE LEI Nº 2.300, DE 1996
(APENSADOS OS PROJETOS DE LEI N.OS 3.755, DE 1997, 4.529, DE 1998, 926, DE 1999, E 5.850, DE 2001)
Suprime o inciso VI do artigo 28 e altera o inciso II do artigo 30 da Lei n.º 8.906, de 4 de julho de 1994, que “dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB”.
Autor: Deputado Jair Bolsonaro
Relator: Deputado José Roberto Batochio

I - RELATÓRIO
A proposta em exame, Projeto de Lei n.º 2.300, de 1996, de autoria do ilustre Deputado Bolsonaro, pretende afastar os militares, de qualquer natureza, do elenco das categorias incompatíveis com o exercício da advocacia.

Para tanto, propugna que, a exemplo do que ocorre com os funcionários civis, os militares sujeitem-se, apenas, às conseqüências da situação de impedimento para o desempenho do mister contra ou a favor de pessoas jurídicas de direito público, empresas públicas, sociedades de economia mista, fundações públicas, entidades paraestatais ou empresas concessionárias ou permissionárias de serviço público, permanecendo-lhes, assim, autorizado o exercício da advocacia em relação às demais pessoas jurídicas e às físicas.
À proposição, que tramitou na legislatura passada, sendo desarquivada nesta, foi apensado o Projeto de Lei de n.º 3.755, de 1997, do Deputado Nelson Harter, que pretende incluir parágrafo ao art. 30 da Lei n.º
8.906/94, dispondo que os Vereadores se encontram em impedimento para o exercício da advocacia somente se as pessoas nomeadas no inciso II do mesmo artigo tiverem relacionamento com o seu Município.
Igualmente ocorreu-lhe a apensação do Projeto de Lei n.º 4.529, de 1998, do Deputado Gonzaga Patriota, que visa à revogação dos incisos IV, V, VI e VII do art. 28 da Lei n.º 8.906/94, os quais, por sua vez, estabelecem a incompatibilidade com o exercício da advocacia dos:
“IV – ocupantes de cargos ou funções vinculados direta ou indiretamente a qualquer órgão do Poder Judiciário e os que exercem serviços notariais e de registro;
V – ocupantes de cargos ou funções vinculados direta ou indiretamente a atividade policial de qualquer natureza;
VI – militares de qualquer natureza, na ativa;
VII – ocupantes de cargos ou funções que tenham competência de lançamento, arrecadação ou fiscalização de tributos e contribuições parafiscais.”
Ao depois, foi-lhe apensado também o Projeto de Lei n.º 936, de 1999, do Deputado Edinho Bez, que acresce o parágrafo 3º ao art. 28 da lei citada, determinando que, nos municípios de pequena expressão populacional – assim definidos pelo Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil do Estado ao qual pertençam –, os membros da Mesa do Poder Legislativo e seus substitutos legais não estarão incompatíveis com o exercício da advocacia.
Finalmente, o projeto original recebeu novo apenso, o Projeto de Lei n.º 5.850, de 2001, do Dep. Max Rosenmann, que promove alteração no inciso I do artigo 28 da Lei n.º 8.906, de 1994, visando a excluir do rol das incompatibilidades com o exercício da advocacia o desempenho de funções de membro da Mesa do Poder Legislativo.
Ressalte-se, por oportuno, que a nenhum dos projetos acima mencionados foram oferecidas emendas.
Finalmente, em atendimento ao estatuído pelo inciso II do art. 24, c/c as alíneas "a" e "d" do inciso III do artigo 32 do Regimento Interno, foi
submetido a esta C.C.J.R. para o indispensável exame da sua constitucionalidade, juridicidade, técnica legislativa e redacional e de mérito, fase em que ora se encontra.
É o relatório.
II - VOTO DO RELATOR
Incumbe, privativa e terminativamente, a esta C.C.J.R. exercer o juízo das proposições acima elencadas, conforme o determinado pelo artigo 54, I, do Regimento Interno.
Analisando-as, verifico que tanto o Projeto de Lei n.º 3.200/96 quanto os que lhe estão apensados revelam-se incapazes de superar os óbices à sua regular tramitação nesta Casa. Senão, vejamos.
Pretendem todas as proposições relacionadas excluir do rol das categorias incompatíveis com o exercício da advocacia atividades que, por sua própria natureza, com ela não se coadunam. Destaque-se que a incompatibilidade é a vedação genérica ao exercício da advocacia, enquanto que o impedimento é a proibição parcial do desempenho daquele mister.
Nesse sentido, os projetos de lei conflitam com o pré-requisito estabelecido constitucionalmente para o exercício da advocacia, inserto no art. 133 da Carta Magna, qual seja, a independência no desempenho de suas funções, bem como com a própria natureza da função de advogado.
Ademais, as proposições colidem também com os fundamentos teleológicos dos institutos da incompatibilidade e do impedimento para o exercício da advocacia, bem explicitados pela Exposição de Motivos do Conselho Federal à Lei n.º 4.215/63, a seguir transcrita:
“Sem chegar ao rigor usual na França, em que o exercício da profissão é incompatível com qualquer função pública, atividade comercial, industrial ou simplesmente civil (artigos 4º, incisos 1º e 2º, 45 e 46 do
Decreto n.º 54.406, de 10-04-54), o anteprojeto adotou o princípio de que a atividade da advocacia é incompatível com qualquer atividade, função ou cargo público que reduza a independência do profissional ou proporcione captação de clientela. E incluiu, entre as funções públicas que podem determinar a incompatibilidade ou o impedimento, qualquer função delegada exercida em comissão ou por servidor de entidade a quem o poder público a tenha cometido por lei ou contrato. (...)”
(Transcrita de “Comentários ao Estatuto da OAB e às Regras da Profissão de Advogado”, Eugênio Haddock Lobo e Francisco Costa Netto, Editora Rio, janeiro de 1978, p.192, sem destaque no original.)
Observa-se, por oportuno, que mesmo a Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994, que revogou a Lei n.º 4.215/63, embora tenha trazido importantes inovações à matéria, não se afastou destes pressupostos da lei revogada.
Diz, a respeito, 1Paulo Luiz Netto Lobo, in “Comentários ao Estatuto da Advocacia”, Ed. Brasília Jurídica, 2ª edição, 1996, pp. 120 e 121:
1 O Prof. Paulo Luiz Netto Lobo foi o Coordenador e Relator da Comissão de Sistematização da OAB que elaborou o anteprojeto do Estatuto, hoje Lei nº 8.906/94.
“O atual Estatuto optou por uma enumeração taxativa, sem qualquer referência a conceitos genéricos e indeterminados nem possibilidade de acréscimos mediante Provimento. As hipóteses são referidas na lei, e apenas estas.
(...)
Destarte, mantiveram-se as hipóteses clássicas ou tradicionais relacionadas a cargos e funções que, por sua natureza, são incompatíveis com o exercício da advocacia, não só por insuperável conflito de interesses mas por fortes motivações éticas, nestes casos quando a função importa exercício de poder decisório relevante, afetando o princípio da igualdade das oportunidades profissionais.
Os impedimentos e incompatibilidades existem em todas as legislações do mundo sobre a advocacia, desde quando o Imperador Justino, de Constantinopla, no século VI, estruturou legalmente a profissão.”
(sem destaque no original)
Da mesma tese compartilham Orlando de Assis Corrêa,
Apio Cláudio de Lima Antunes, Jayme Paz da Silva e Marco Túlio de Rose, autores de “Comentários ao Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB”, Aide Editora, 1995, pp. 118 a 124, para quem a advocacia é incompatível com as atividades sob comento tanto em face da natureza dos cargos atingidos como pela possibilidade de captação de clientela, caracterizando concorrência desleal.
Especialmente quanto aos militares na ativa, registram aqueles autores que eles “não podem advogar, porque sua função e seu cargo exigem dedicação exclusiva e tempo integral. O militar, quando na ativa, é considerado permanentemente em serviço, e não seria compatível o exercício da advocacia com esta dedicação”.
No que respeita aos Vereadores, que integram a Mesa do Poder Legislativo, ou os seus substitutos, no exercício do cargo, dizem aqueles juristas que:
“... os que exercem tais cargos nos municípios, que poderiam lembrar que são desconhecidos, na maioria dos casos, fora do seu território, teriam grande influência dentro dos municípios, talvez mais fortes que aquela referente aos que detêm cargos estaduais ou federais, porque o universo de clientes e de advogados, mais restrito, possibilita uma maior atenção aos que estão no poder local”.
Por outro lado, quanto aos ocupantes de cargos ou funções vinculados direta ou indiretamente a qualquer órgão do Poder Judiciário e aos que exercem serviços notariais e de registro, elencados no inc. IV do art. 28 do Estatuto vigente como incompatíveis para o exercício da advocacia, diz o Prof. Paulo Luiz Netto Lobo, obra cit., pp. 127/8, que:
“Este aparente excesso de rigor é necessário para garantir a independência do advogado, sobretudo em face da população. (...) O mais simples serventuário pode exercer perigoso tráfico de influência na tramitação e resultado de processos judiciais, tendo em vista seu convívio diuturno com juizes, promotores e os auxiliares da justiça. O exercício da advocacia, nestas circunstâncias, representa enorme risco à dignidade e à independência da profissão”.
(sem destaque no original)
Ressalta, ainda, o mesmo autor, a fls. 128/9 da obra supramencionada, que, se os ocupantes de cargos e funções relacionados com a receita pública fossem autorizados a advogar, “a tentação rondaria cada passo desses importantes agentes públicos, que devem dedicar a suas tarefas total exclusividade, com remuneração digna”.
Ao fim, no que diz respeito aos policiais, a meu ver, é inconteste a incompatibilidade de suas funções com o exercício da advocacia, vez que, com toda a certeza, as informações privilegiadas de que são detentores em virtude de suas atribuições funcionais possibilitariam não só a interferência sobre inquéritos e demais procedimentos investigatórios, quanto mais a própria captação de clientela.
Resulta de todo o exposto que os projetos de lei acima referenciados se apresentam inconstitucionais e injurídicos, por violar não só o art. 133 da CF mas também a própria natureza da função de Advogado, segundo a disciplina da Lei n.º 8.906, de 4 de julho de 1994.
Ante todo o expendido, voto pela rejeição do Projeto de Lei n.º 2.300, de 1996, e de seus apensos, o Projeto de Lei n.º 3.755, de 1997, o Projeto de Lei n.º 4.529, de 1998, o Projeto de Lei n.º 926, de 1999, e o Projeto de Lei n.º 5.850, de 2001, em face da sua inconstitucionalidade e injuridicidade, e, no mérito, por seu improvimento.
Sala da Comissão, em de de 2002.
Deputado José Roberto Batochio
Relator
203143.166

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