Embaixador John Ashe,
Presidente da sexagésima-oitava Assembleia-Geral das Nações Unidas, Senhor Ban Ki-Moon,
Secretário-Geral das Nações Unidas,Excelentíssimos Senhores Chefes
de Estado e de Governo, Senhoras e Senhores.
Permitam-me uma primeira
palavra para expressar minha satisfação em ver um ilustre representante de
Antigua e Barbuda – país que integra o Caribe tão querido no Brasil e em nossa
região – à frente dos trabalhos desta Sessão da Assembleia-Geral. Conte, Excelência, com o apoio
permanente de meu Governo.
Permitam-me também, já no
início da minha intervenção, expressar o repúdio do Governo e do povo
brasileiro ao atentado terrorista ocorrido em Nairóbi. Expresso as nossas
condolências e a nossa solidariedade às famílias das vítimas, ao povo e ao
Governo do Quênia.
O terrorismo, onde quer que
ocorra e venha de onde vier, merecerá sempre nossa condenação inequívoca e
nossa firme determinação em combatê-lo. Jamais transigiremos com a barbárie.
Senhor Presidente,
Quero trazer à consideração das
delegações uma questão à qual atribuo a maior relevância e gravidade.
Recentes revelações sobre as
atividades de uma rede global de espionagem eletrônica provocaram indignação e
repúdio em amplos setores da opinião pública mundial.
No Brasil, a situação foi ainda
mais grave, pois aparecemos como alvo dessa intrusão. Dados pessoais de
cidadãos foram indiscriminadamente objeto de interceptação. Informações
empresariais – muitas vezes, de alto valor econômico e mesmo estratégico -
estiveram na mira da espionagem. Também representações diplomáticas
brasileiras, entre elas a Missão Permanente junto às Nações Unidas, e a própria
Presidência da República tiveram suas comunicações interceptadas.
Imiscuir-se dessa forma na vida
de outros Países fere o Direito Internacional e afronta os princípios que devem
reger as relações entre eles, sobretudo, entre nações amigas. Jamais pode uma
soberania firmar-se em detrimento de outra soberania. Jamais pode o direito à
segurança dos cidadãos de um país ser garantido mediante a violação de direitos
humanos e civis fundamentais dos cidadãos de outro país. Pior ainda quando
empresas privadas estão sustentando esta espionagem.
Não se sustentam argumentos de
que a interceptação ilegal de informações e dados destina-se a proteger as
nações contra o terrorismo.
O Brasil, Senhor Presidente,
sabe proteger-se. O Brasil, Senhor Presidente, repudia, combate e não dá abrigo
a grupos terroristas.
Somos um país democrático,
cercado de países democráticos, pacíficos e respeitosos do Direito
Internacional. Vivemos em paz com os nossos vizinhos há mais de 140 anos.
Como tantos outros
latino-americanos, lutei contra o arbítrio e a censura e não posso deixar de
defender de modo intransigente o direito à privacidade dos indivíduos e a
soberania de meu País. Sem ele – direito à privacidade - não há verdadeira
liberdade de expressão e opinião e, portanto, não há efetiva democracia. Sem
respeito à soberania, não há base para o relacionamento entre as Nações.
Estamos, Senhor Presidente,
diante de um caso grave de violação dos direitos humanos e das liberdades
civis; da invasão e captura de informações sigilosas relativas às atividades
empresariais e, sobretudo, de desrespeito à soberania nacional do meu País.
Fizemos saber ao Governo
norte-americano nosso protesto, exigindo explicações, desculpas e garantias de
que tais procedimentos não se repetirão.
Governos e sociedades amigas,
que buscam consolidar uma parceria efetivamente estratégica, como é o nosso
caso, não podem permitir que ações ilegais, recorrentes, tenham curso como se
fossem normais. Elas são inadmissíveis.
O Brasil, Senhor Presidente,
redobrará os esforços para dotar-se de legislação, tecnologias e mecanismos que
nos protejam da interceptação ilegal de comunicações e dados.
Meu Governo fará tudo que
estiver a seu alcance para defender os direitos humanos de todos os brasileiros
e de todos os cidadãos do mundo e proteger os frutos da engenhosidade dos
trabalhadores e das empresas brasileiras.
O problema, porém, transcende o
relacionamento bilateral de dois países. Afeta a própria comunidade
internacional e dela exige resposta. As tecnologias de telecomunicação e
informação não podem ser o novo campo de batalha entre os Estados. Esse é o
momento de criarmos as condições para evitar que o espaço cibernético seja
instrumentalizado como arma de guerra, por meio da espionagem, da sabotagem,
dos ataques contra sistemas e infraestrutura de outros países.
A ONU deve desempenhar um papel
de liderança no esforço de regular o comportamento dos Estados frente a essas
tecnologias. E a importância da internet, dessa rede social, para a construção
da democracia no mundo.
Por essa razão, Senhor
Presidente, o Brasil apresentará propostas para o estabelecimento de um marco
civil multilateral para a governança e uso da internet e de medidas que
garantam uma efetiva proteção dos dados que por ela trafegam.
Precisamos estabelecer para a
rede mundial mecanismos multilaterais capazes de garantir princípios como:
1 - Da liberdade de expressão,
privacidade do individuo e respeito aos direitos humanos.
2 - Da Governança democrática,
multilateral e aberta, exercida com transparência, estimulando a criação
coletiva e a participação da sociedade, dos governos e do setor do privado.
3 - Da universalidade que
assegura o desenvolvimento social e humano e a construção de sociedades
inclusivas e não discriminatórias.
4 - Da diversidade cultural,
sem imposição de crenças, costumes e valores.
5 - Da neutralidade da rede, ao
respeitar apenas critérios técnicos e éticos, tornando inadmissível restrições
por motivos políticos, comerciais, religiosos ou de qualquer outra natureza.
O aproveitamento do pleno
potencial da internet passa, assim, por uma regulação responsável, que garanta
ao mesmo tempo liberdade de expressão, segurança e respeito aos direitos
humanos.
Senhor Presidente, Senhoras e
Senhores,
Não poderia ser mais oportuna a
escolha da agenda de desenvolvimento pós-2015 como tema desta Sessão da
Assembleia-Geral.
O combate à pobreza, à fome, à
desigualdade constitui o maior desafio de nosso tempo.
Por isso, adotamos no Brasil um
modelo econômico com inclusão social, que se assenta na geração de empregos, no
fortalecimento da agricultura familiar, na ampliação do crédito, na valorização
do salário e na construção de uma vasta rede de proteção social,
particularmente por meio do nosso programa Bolsa Família.
Além das conquistas anteriores,
retiramos da extrema pobreza, com o Plano Brasil sem Miséria, 22 milhões de
brasileiros, em apenas dois anos.
Reduzimos de forma drástica a
mortalidade infantil. Relatório recente do UNICEF aponta o Brasil como país que
promoveu uma das maiores quedas deste indicador em todo o mundo.
As crianças são prioridade para
o Brasil. Isso se traduz no compromisso com a educação. Somos o país que mais
aumentou o investimento público no setor educacional, segundo o ultimo
relatório da OCDE. Agora vinculamos, por meio de lei, 75% de todos os royalties
do petróleo para a educação e 25% para a saúde.
Senhor Presidente, no debate sobre a Agenda de
Desenvolvimento pós-2015, devemos ter como eixo os resultados da Rio+20.
O grande passo que demos no Rio
de Janeiro foi colocar a pobreza no centro da agenda do desenvolvimento
sustentável. A pobreza, Senhor Presidente, não é um problema exclusivo dos
países em desenvolvimento, e a proteção ambiental não é uma meta apenas para
quando a pobreza estiver superada.
O sentido da agenda pós-2015 é
a construção de um mundo no qual seja possível crescer, incluir, conservar e
proteger.
Ao promover, Senhor Presidente,
a ascensão social e superar a extrema pobreza, como estamos fazendo, nós
criamos um imenso contingente de cidadãos com melhores condições de vida, maior
acesso à informação e mais consciência de seus direitos.
Um cidadão com novas
esperanças, novos desejos e novas demandas.
As manifestações de junho, em
meu País, são parte indissociável do nosso processo de construção da democracia
e de mudança social.
O meu governo não as reprimiu,
pelo contrário, ouviu e compreendeu a voz das ruas. Ouvimos e compreendemos
porque nós viemos das ruas.
Nós nos formamos no cotidiano
das grandes lutas do Brasil. A rua é o nosso chão, a nossa base.
Os manifestantes não pediram a
volta ao passado. Os manifestantes pediram, sim, o avanço para um futuro de
mais direitos, mais participação e mais conquistas sociais.
No Brasil, foi nessa década que
houve a maior redução de desigualdade dos últimos 50 anos. Foi nesta década que
criamos um sistema de proteção social que nos permitiu agora praticamente superar
a extrema pobreza.
Sabemos que democracia gera
mais desejo democracia. Inclusão social provoca cobrança de mais inclusão
social. Qualidade de vida desperta anseio por mais qualidade de vida.
Para nós, todos os avanços
conquistados são sempre só um começo. Nossa estratégia de desenvolvimento exige
mais, tal como querem todos os brasileiros e as brasileiras.
Por isso, não basta ouvir, é
necessário fazer. Transformar essa extraordinária energia em realizações para
todos.
Por isso, lancei 5 grandes pactos:
o pacto pelo Combate à Corrupção e pela Reforma Política; o pacto pela
Mobilidade Urbana, pela melhoria do transporte público e por uma reforma
urbana; o pacto pela Educação, nosso grande passaporte para o futuro, com o
auxílio dos royalties e do fundo social do petróleo; o pacto pela Saúde, o qual
prevê o envio de médicos para atender e salvar as vidas dos brasileiros que
vivem nos rincões mais remotos e pobres do país; o pacto pela Responsabilidade
Fiscal, para garantir a viabilidade dessa nova etapa.
Senhoras e Senhores, passada a fase mais aguda da
crise, a situação da economia mundial ainda continua frágil, com níveis de
desemprego inaceitáveis.
Os dados da OIT indicam a
existência de mais de 200 milhões de desempregados em todo o mundo.
Esse fenômeno afeta as
populações de países desenvolvidos e em desenvolvimento.
Este é o momento adequado para
reforçar as tendências de crescimento da economia mundial que estão agora dando
sinais de recuperação.
Os países emergentes, sozinhos,
não podem garantir a retomada do crescimento global. Mais do que nunca, é
preciso uma ação coordenada para reduzir o desemprego e reestabelecer o
dinamismo do comércio internacional. Estamos todos no mesmo barco.
Meu país está recuperando o
crescimento apesar do impacto da crise internacional nos últimos anos. Contamos
com três importantes elementos: i) o compromisso com políticas macroeconômicas
sólidas; ii) a manutenção de exitosas políticas sociais inclusivas; iii) e a
adoção de medidas para aumentar nossa produtividade e, portanto, a
competitividade do País.
Temos compromisso com a
estabilidade, com o controle da inflação, com a melhoria da qualidade do gasto
público e a manutenção de um bom desempenho fiscal.
Seguimos, Senhor Presidente,
apoiando a reforma do FMI.
A governança do fundo deve
refletir o peso dos Países emergentes e em desenvolvimento na economia mundial.
A demora nessa adaptação reduz sua legitimidade e sua eficácia.
Senhoras e Senhores, Senhor
Presidente, o ano de 2015 marcará o 70º
aniversário das Nações Unidas e o 10º aniversário da Cúpula Mundial de 2005.
Será a ocasião para realizar a
reforma urgente que pedimos desde aquela cúpula.
Impõe evitar a derrota coletiva
que representaria chegar a 2015 sem um Conselho de Segurança capaz de exercer plenamente
suas responsabilidades no mundo de hoje.
É preocupante a limitada
representação do Conselho de Segurança da ONU face os novos desafios do século
XXI.
Exemplos disso são a grande
dificuldade de oferecer solução para o conflito sírio e a paralisia no
tratamento da questão israelo-palestina.
Em importantes temas, a
recorrente polarização entre os membros permanentes gera imobilismo perigoso.
Urge dotar o Conselho de vozes
ao mesmo tempo independentes e construtivas. Somente a ampliação do número de
membros permanentes e não permanentes, e a inclusão de países em
desenvolvimento em ambas as categorias, permitirá sanar o atual déficit de
representatividade e legitimidade do Conselho.
Senhor Presidente, o Debate Geral oferece a
oportunidade para reiterar os princípios fundamentais que orientam a política
externa do meu país e nossa posição em temas candentes da realidade e da
atualidade internacional. Guiamo-nos pela defesa de um mundo multilateral,
regido pelo Direito Internacional, pela primazia da solução pacífica dos
conflitos e pela busca de uma ordem solidária e justa – econômica e
socialmente.
A crise na Síria comove e
provoca indignação. Dois anos e meio de perdas de vidas e destruição causaram o
maior desastre humanitário deste século.
O Brasil, que tem na
descendência síria um importante componente de nossa nacionalidade, está
profundamente envolvido com este drama.
É preciso impedir a morte de
inocentes, crianças, homens, mulheres e idosos. É preciso calar a voz das armas
– convencionais ou químicas, do governo ou dos rebeldes.
Não há saída militar. A única
solução é a negociação, o diálogo, o entendimento.
Foi importante a decisão da
Síria de aceder à Convenção sobre a Proibição de Armas Químicas e aplicá-la
imediatamente.
A medida é decisiva para
superar o conflito e contribui para um mundo livre dessas armas. Seu uso,
reitero, é hediondo e inadmissível em qualquer situação.
Por isso, apoiamos o acordo
obtido entre os Estados Unidos e a Rússia para a eliminação das armas químicas
sírias. Cabe ao Governo sírio cumpri-lo integralmente, de boa-fé e com ânimo
cooperativo.
Em qualquer hipótese,
repudiamos intervenções unilaterais ao arrepio do Direito Internacional, sem
autorização do Conselho de Segurança. Isso só agravaria a instabilidade política
da região e aumentaria o sofrimento humano.
Da mesma forma, a paz duradoura
entre Israel e Palestina assume nova urgência diante das transformações por que
passa o Oriente Médio.
É chegada a hora de se atender
as legítimas aspirações palestinas por um Estado independente e soberano.
É também chegada a hora de
transformar em realidade o amplo consenso internacional em favor de uma solução
de dois Estados.
As atuais tratativas entre
israelenses e palestinos devem gerar resultados práticos e significativos na
direção de um acordo.
Senhor Presidente, Senhoras e
Senhores, s história do século XX mostra
que o abandono do multilateralismo é o prelúdio de guerras, com seu rastro de
miséria humana e de devastação.
Mostra também que a promoção do
multilateralismo rende frutos nos planos ético, político e institucional.
Renovo, assim, o apelo em prol
de uma ampla e vigorosa conjunção de vontades políticas que sustente e revigore
o sistema multilateral, que tem nas Nações Unidas seu principal pilar.
Em seu nascimento, reuniram-se
as esperanças de que a humanidade poderia superar as feridas da Segunda Guerra
Mundial.
De que seria possível
reconstruir, dos destroços e do morticínio, um mundo novo de liberdade, de
solidariedade e prosperidade.
Temos todos a responsabilidade
de não deixar morrer essa esperança tão generosa e tão fecunda.
Muito obrigada, Senhores e
Senhoras.
Fonte: MRE
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